“Eu sinto a natureza me dando um empurrão.
Não um desnorteante, desestabilizador, tropeçado.
Um pra frente, com força. Otimista.
A mesma força que o mar me jogou pra fora quase gritando: agora não.
Mas só uma alusão a essa força. Porque o sentimento é de um empurrão me convidando a entrar.
Saindo do raso e entrando profundo.
Com cheiro de nuvem limpa e gosto salgado de lágrima.
As flores me valorizam. O sol se abre só pra mim. O livro faz todo o sentido.
Te acho sozinho no mar. Num zoom in.
Se destacando brilhante no efeito de uma lupa.
Agora.
O mar parou. Eu relaxei.
Agora. Vem.
Desde que te conheci as coisas começaram a dar certo pra mim.
As lanternas se acenderam.
As memórias voltaram. Do que já aconteceu, do que nunca foi visto e do que vai acontecer.
A passagem foi em vida.
O caleidoscópio rodou você.
Em vida.
Com amor, Samarinha.”
>A lanterna das Memórias Perdidas . Sanaka Hiiragi
>Enviada por Samara
>Ela conta: Eu nunca tinha dividido a leitura de um livro com alguém, até me apaixonar pelo Kei.
Nos reencontramos em novembro de 2024 e, depois de nos vermos novamente em fevereiro deste ano, resolvi enviar o livro de presente para a casa dele. Detalhe: eu nunca tinha lido o livro (um crime, eu sei). Mas, em minha defesa, algo nele parecia falar sobre nós. Dias antes, o algoritmo me levou para um vídeo aleatório de uma menina comentando sobre a história e sobre a autora, que é japonesa, e senti que fazia todo sentido. O livro se passa em um estúdio fotográfico onde as pessoas vão quando morrem e fala sobre vida e memórias.
Eu e o Kei nos conhecemos há sete anos. E a fotografia sempre foi o ponto de partida da nossa conexão, onde tudo começou. Foi em momentos a sós com uma câmera na mão, durante a viagem em que nos conhecemos, que desenvolvemos amizade, carinho e incontáveis conversas sobre nossas lembranças e como a gente via o mundo e se expressava através de imagens.
26.02
— Vc me mandou um livro?
— Mandei. Esqueci de avisar. É seu presente!
— Desculpa, acabei de abrir.
— Tudo bem.
— Estava em meu nome, por isso abri achando que era alguma coisa minha. Quero que você escreva uma dedicatória pra mim.
— Acho que você vai adorar. Não li ainda, mas quando vi um vídeo sobre ele pensei que eu e você iríamos amar.
— Vou deixar aqui no canto. Vamos ler juntos.
— Ótimo. Vamos!
Eu só não imaginava que “ler juntos” significaria literalmente ler juntos. Até porque estávamos separados por 2120 km de distância e eu passaria apenas alguns dias em São Paulo, no final de março.
Quando cheguei, viajamos para a praia e enquanto eu o observava no mar, impulsionada e completamente tomada pelo que estávamos vivendo depois de sete anos, escrevi essa dedicatória no bloco de notas do celular. Ainda não tinha lido uma página sequer do livro.
Dias depois, fomos no Museu de Imagem e Som (MIS) e vimos o acervo chamado Linha do tempo da fotografia (uma sala repleta de câmeras de 1880 até os anos 2000). Depois, fomos ao parque e decidimos iniciar a leitura. Foi a primeira vez, desde que eu era criança, que alguém leu pra mim. E eu me apaixonei ainda mais.
Antes de voltar para minha cidade, alternamos a leitura de mais algumas páginas, em outro dia ensolarado no parque, e, antes de irmos embora, entreguei meu celular para que ele lesse o que eu escrevi na praia. Ele leu em voz alta até ficar em silêncio com os olhos cheios de lágrimas. E em silêncio ficamos por um bom tempo. Transcrevi esse mesmo texto na contracapa do livro e fui embora com o coração apertado.
Não terminamos o livro, como era de se esperar. Ficou apenas a esperança de nos vermos outra vez, sem data definida para o desenrolar do livro e da gente.
Mas, pouco tempo depois, as “coisas começaram a dar certo pra mim" pra valer.
Me mudei para São Paulo.
Começamos nossa história e terminamos o livro.
No parque. Juntos. Outra vez.