sábado, dezembro 27, 2025

10 filmes de 2025 [3]

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* A HOUSE OF DYNAMITE, Kathryn Bigelow
 
Assim vai o mundo, quer dizer, o entendimento do mundo do cinema pela Netflix. Por um lado, a plataforma vai gerando filmes que, pela sua intensidade dramática e vibração visual, pertencem ao grande ecrã; por outro lado, muitos desses filmes surgem discretamente num pequeno número de salas (select theatres), sendo-nos servidos nos limites dos nossos espaços caseiros. Neste caso, com uma ironia cruel: esta hstória de um míssil anónimo (?) que está prestes a destruir a cidade de Chicago "passa" como se fosse um vulgar thriller de guerra, mas daqui a dez ou vinte anos será consagrada como uma das mais subtis ficções sobre o imaginário político da era Trump... Com um pormenor nada secundário: é mesmo um "thriller" de guerra, mas nada vulgar, para mais com uma notável coleção de actores — Idris Elba, Rebecca Ferguson, Tracy Letts, etc. —, sempre impecáveis, mesmo quando se limitam a pontuar uma cena.


[ Sorry, Baby ] [ Depois da Caçada ]

sexta-feira, dezembro 26, 2025

10 discos de 2025 [3]

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* SELF PORTRAIT, Ryan Adams

Os tempos não são simpáticos para os trovadores. Entenda-se: para aqueles que cantam as secretas emoções dos amantes e outros nómadas sociais, sem fingirem que têm alguma terapia mediática para partilhar connosco. Depois de 2024, ano em que lançou cinco álbuns, Ryan Adams cumpriu 2025 "apenas" com a edição comemorativa dos 25 anos de Heartbreaker e este contido e, claro, trovadoresco Self Portrait (ouça-se o emblemático Fool's Game). Definitivamente inclassificável, Ryan Adams não desiste do maravilhoso escândalo que consiste em declarar que a música popular parou no tempo — aliás, o tempo pára com ela.
 

[ Patti Smith ] [ Taylor Swift ]

quinta-feira, dezembro 25, 2025

10 filmes de 2025 [2]

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* DEPOIS DA CAÇADA, Luca Guadagnino
 
Num balanço aberto a tudo aquilo que nos filmes deixa marcas que transcendem a "acção" e as suas "explicações" mais ou menos deterministas, este After the Hunt teria um trunfo radical para não ser esquecido. A saber: a linha de diálogo com que a personagem de Julia Roberts responde a uma jovem "desconfortável" porque o mundo não se adequa à sua pobre mentalidade politcamente correcta. Lembremos: "Nem tudo é suposto fazer-te sentir confortável." Um filme capaz de expor o imaginário social que sustenta tudo isso, ao mesmo tempo preservando as regras clássicas do melodrama — e, mais do que isso, a espessura existencial das palavras —, eis uma verdadera bênção cinematográfica. Com um elenco realmente excepcional, incluindo o sempre esquecido (e sempre admirável) Michael Stuhlbarg.


[ Sorry, Baby ]

quarta-feira, dezembro 24, 2025

10 discos de 2025 [2]

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* THE LIFE OF A SHOWGIRL, Taylor Swift

Para uma estrela pop pós-Madonna, a "introspeção" criativa passou a ser uma espécie de obrigação moral que, em boa verdade, se resume muitas vezes a um banal caderno de encargos mediático. Em vez de se desviar dessa maldição conceptual, Taylor Swift decide olhá-la de frente para a virar do avesso. Daí que a sugestão de auto-retrato desta vida de uma "showgirl" tenha tanto de confessional como de irónico, além do mais denunciando a moda da "apatia" imposta pela Net (escute-se Eldest Daughter). A recordação de Elizabeth Taylor (na canção homónima) possui, por isso, a energia de um verdadeiro "statement" artístico e, porque não dizê-lo, cinéfilo.
 

[ Patti Smith ]

sábado, dezembro 20, 2025

10 filmes de 2025 [1]

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* SORRY, BABY, Eva Victor
 
Se qualquer balanço de um ano de cinema deve dar alguma atenção aos estreantes, então esta primeira longa-metragem da franco-americana Eva Victor merece um destaque muito especial. Para lá dos estafados dramas de uma "juventude" à procura da sua identidade, ela constrói uma genuína deambulação emocional por um universo de solidões partilhadas em que vida e morte se entrelaçam de forma suave — com ternura, se é que podemos arriscar tal palavra. A própria realizadora assume o papel central, propondo na cena final (que justifica o título) as certezas e dúvidas de uma verdadeira filosofia existencial.

10 discos de 2025 [1]

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* HORSES, Patti Smith

Enfim, este é de 1975. Why not? Chama-se Horses, foi o álbum de estreia de Patti Smith e teve edição especial de cinquentenário, lembrando-nos que o punk (será que a palavra resiste às banalizações mediáticas?) nunca abandonou o nosso cenário espiritual. Em paralelo, já agora, com o maravilhoso livro autobiográfico Bread of Angels — e sem esquecer também que todas as memórias envolvidas estão eternizadas na fotografia de Robert Mapplethorpe. Este registo da canção-título é da BBC, em 1976.
 

Memórias de 2025
* SOUND + VISION Magazine / FNAC [ hoje, 20 dez.]

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Renovando a tradição, a próxima sessão do Sound+Vision Magazine propõe um inventário de algumas memórias (musicais, cinematográficas) que marcaram o ano de 2025 — não necessariamente um top, antes a recordação de algumas canções e filmes, talvez menos óbvias, que deixaram memórias fortes.

>>> FNAC Chiado — 20 dezembro (17h00).

sexta-feira, dezembro 19, 2025

Alejandro González Iñárritu & Tom Cruise

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Para registar na agenda: Digger tem estreia marcada para 2 de outubro de 2026. Com chancela da Warner Bros., a nova realização de Alejandro González Iñárritu mobiliza um elenco liderado por Tom Cruise, incluindo Jesse Plemons, Sandra Hüller, Riz Ahmed, Sophie Wilde, Emma D'Arcy, Robert John Burke, Burn Gorman, Michael Stuhlbarg e John Goodman; a direção fotográfica é, como sempre, de Emmanuel Lubezki — o primeiro trailer dura 50 segundos, tão sugestivos quanto intrigantes.
 

segunda-feira, dezembro 15, 2025

Frankenstein à deriva na Netflix

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Oscar Isaac em Frankenstein: muitos meios, poucas ideias

Promovido e aguardado como um projecto invulgar, tanto do realizador Guillermo del Toro, como da própria Netflix, o novo Frankenstein limita-se a ser um aparatoso desastre cinematográfico — este texto foi publicado no Diário de Notícias (13 novembro).

Nestes tempos de dispersão dos espectadores por múltiplas formas de difusão dos filmes, porque é que o novo Frankenstein, da Netflix, não teve alguma difusão nas salas (nem que fossem aquelas duas ou três semanas de “montra” para preparar o lançamento em streaming)? Não era este o “projecto de toda uma vida” do seu autor, Guillermo del Toro? Não é a criatura concebida pelo Barão Victor Frankenstein uma referência lendária de mais de dois séculos de literatura e cinema? Convém, aliás, lembrar que o romance de Mary Shelley foi publicado em 1818, enquanto o Frankenstein protagonizado por Boris Karloff e realizado por James Whale, “fundador” de um género eminentemente popular, data de 1931.
A redução deste Frankenstein ao aparato dos nossos ecrãs caseiros acaba mesmo por reflectir uma contradição técnica e estética que permanece longe de qualquer solução. Por um lado, há filmes como este que, pelo seu investimento espectacular (em particular, pela monumentalidade do respetivo trabalho cenográfico), continuam a seguir uma lógica clássica de produção ligada, precisamente, às dimensões de uma também clássica sala de cinema; por outro lado, muitos desses filmes vivem “enquistados” no universo específico do streaming.
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Enfim, talvez seja tempo perdido relançar tais questões, mesmo se é verdade que os seus impasses continuam a pontuar a vida (ou a morte, se nos inscrevermos no campo mais pessimista) de todo o cinema contemporâneo. Será mais simples, e também mais pertinente, ficarmos por uma observação rudimentar. A saber: o novo Frankenstein, de Guillermo del Toro, é um aparatoso desastre cinematográfico.
Impossível vislumbrar alguma relação com a tradição, seja ela a dos estúdios Universal (de que Whale foi um dos criadores emblemáticos) ou, por exemplo, a que foi gerada nas décadas de 1950/60 pelos estúdios britânicos da Hammer Film (com distinção especial para o realizador Terence Fisher). Nem sequer encontramos aqui esse radicalismo inventivo, fora de qualquer estilo, do Frankenstein de Andy Warhol em 3D (Carne para Frankenstein, realizado por Paul Morrissey em 1973).
Guillermo Del Toro terá querido repetir a lição moral do seu filme A Forma da Água (2017), apesar de tudo bem mais interessante, dispensando o próprio romance e transformando o monstro criado por Frankenstein num pobre diabo capaz de “simbolizar” a inocência perdida dos humanos. Seria, talvez, uma nota dramática curiosa, mas faltam ideias práticas para tratar uma história que exigiria algo mais do que uma acelerada câmara de filmar que nem sequer sabe rentabilizar a pompa (algo postiça, convenhamos) dos cenários.

sábado, dezembro 13, 2025

Ozu por Patti Smith

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[ FOTO: Patti Smith ]

A renovada maravilha das palavras e da arte de as dizer: Patti Smith partilha alguns pensamentos em torno das memórias de Yasujiro Ozu (1903-1963) — o video foi filmado no dia 12 de dezembro, data do nascimento e da morte de Ozu.

Ozu by Patti Smith

Mu and nothingness and nothing much

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[ FOTO: Shigeru Tanura ]